top of page

O impacto do ECA digital no marketing de influência: Como a nova Lei 15.211/2025 muda a vida dos Criadores de conteúdo digital

  • Foto do escritor: Bruno Calixto
    Bruno Calixto
  • 14 de nov.
  • 7 min de leitura

Atualizado: 1 de dez.



A consolidação da Lei 15.211/2025, conhecida como ECA Digital, inaugura um novo capítulo para a publicidade online e, de forma muito especial, para o mercado de influência. Se antes a atuação de criadores, agências e marcas orbitava em torno de diretrizes dispersas — entre o Código de Defesa do Consumidor, a LGPD, o Marco Civil da Internet e resoluções esparsas do CONAR — agora existe um marco legal específico que disciplina a presença de crianças e adolescentes no ambiente digital. Essa mudança não é apenas normativa: representa uma inflexão profunda na forma como o ecossistema de conteúdo remunerado se sustenta, se organiza e se relaciona com seu público mais vulnerável.

Nos últimos anos, consolidou-se um modelo de negócios baseado na monetização da atenção infantil: vídeos voltados a menores, publicidade disfarçada em conteúdo aparentemente orgânico, exploração do carisma de influenciadores-mirins, coleta silenciosa de dados para segmentação comportamental e estímulo ao consumismo precoce mediante estratégias de persuasão adaptadas à cognição infantil. O caso do canal “Bel para Meninas”, investigado pelo Ministério Público por possível exploração comercial, e a condenação da Mattel por utilizar youtubers para promover brinquedos sem identificação publicitária foram apenas sinais de uma avalanche de práticas que, somadas, tornaram evidente a necessidade de intervenção regulatória. O ECA Digital nasce dessa urgência, mas vai além de punir excessos: ele propõe um novo paradigma.


O fim da publicidade disfarçada


Para o marketing de influência, a primeira fronteira impactada é a transparência. A legislação considera que a criança é incapaz de distinguir natureza comercial e conteúdo espontâneo, motivo pelo qual impõe um rigor muito maior na identificação clara de patrocínios, parcerias e ativações. A lógica da “publicidade velada”, tão comum no conteúdo voltado ao público infantojuvenil, torna-se incompatível com o ECA. Essa exigência não recai apenas sobre o influenciador, mas também sobre marcas e agências, que passam a assumir responsabilidade solidária por qualquer comunicação que utilize menores como audiência ou como participantes remunerados.

Esse dever de clareza se articula com a LGPD, ao proibir o uso de dados de crianças para publicidade comportamental. A lei reforça que não há base legal de interesse legítimo para esse perfilamento, inviabilizando o uso de cookies, metadados ou rastreamento para veicular anúncios personalizados aos menores. Isso gera uma ruptura significativa no mercado, pois afeta desde adtechs (como o Google ads e META ads) até a estratégia de segmentação de campanhas nas plataformas sociais. Agora, todo tipo de publicidade voltada para o público infanto-juvenil deve vir devidamente identificada como.


A presença de menores como “conteúdo” e o retorno ao paradigma protetivo


Outro eixo crítico do ECA Digital diz respeito à participação de crianças e adolescentes como criadores de conteúdo. O mercado de influenciadores-mirins, que cresceu de maneira acelerada e desordenada, passa a ser enquadrado em parâmetros rígidos de proteção trabalhista, jornada, frequência escolar e destinação das receitas, replicando lógicas semelhantes às das atividades artísticas tradicionais. O conteúdo monetizado deixa de ser tratado como mera informalidade doméstica e passa a demandar controle jurídico, supervisão familiar e, em determinadas situações, autorização judicial.

Marcas que contratam menores como rosto de campanhas digitais não poderão mais seguir com contratos amadores ou arranjos tácitos. A exploração comercial de imagem infantil, mesmo quando mascarada como rotina familiar, agora pode configurar violação de direitos da personalidade e sujeitar tanto responsáveis quanto empresas a sanções importantes.


Os novos limites à influência sobre crianças e adolescentes


A emergência do ECA Digital ocorre em um cenário em que plataformas de apostas, jogos online, conteúdos de violência simulada, desafios virais e consumo de produtos financeiros têm circulado, com aparência de inocuidade, por meio de influenciadores populares entre o público juvenil. O legislador, reconhecendo a hipervulnerabilidade desse grupo, estabelece um conjunto de barreiras à promoção desses conteúdos em canais cuja audiência é majoritariamente composta por menores. Isso não significa censura, mas sim a imposição de um dever objetivo de diligência.

Esse dever se torna ainda mais relevante quando combinado com princípios já existentes no Marco Civil da Internet e na LGPD, que atribuem às plataformas a obrigação de proteger vulneráveis e evitar práticas que explorem fragilidades cognitivas. O ECA Digital reforça esse comando ao vedar estratégias de design que induzam comportamentos compulsivos, como mecanismos de urgência artificial, recompensas manipulativas, gamificação de consumo e padrões de persuasão direcionados especificamente ao perfil infantil.


O “notice and takedown” e o risco para influenciadores e marcas


Um dos pontos mais transformadores da nova lei é o regime de “notice and takedown” (notificação e derrubada). O ECA Digital exige que as plataformas adotem medidas proativas para remover conteúdo que viole direitos de crianças, especialmente nos casos de exposição indevida, sexualização, exploração econômica ou publicidade abusiva. Esse dever implica resposta imediata a denúncias, sem necessidade de ordem judicial, e a comunicação às autoridades competentes quando houver risco concreto aos menores.

Para influenciadores e marcas, isso significa um ambiente de risco reputacional e regulatório muito maior. Conteúdos que envolvam crianças de forma inadequada podem ser retirados do ar rapidamente, e contas reincidentes podem sofrer restrições, desmonetização, suspensão e até banimento definitivo. Essa dinâmica tende a gerar um efeito preventivo: creators passarão a adotar estratégias mais conservadoras, enquanto anunciantes buscarão cláusulas contratuais que minimizem exposição.

O “notice and takedown” também cria um novo campo de litígios, pois a retirada de conteúdo sem ordem judicial pode ser contestada pelos influenciadores que se considerarem prejudicados. O debate deverá envolver princípios constitucionais de liberdade de expressão, mas, diante da proteção prioritária da infância, a tendência é que o Judiciário se incline a prestigiar a atuação preventiva das plataformas, desde que observados os limites da razoabilidade.

A consequência prática é um ecossistema em que influenciadores que descumprirem o ECA Digital terão sua capacidade de alcance reduzida não apenas por decisões administrativas, mas também por algoritmos que, em resposta ao risco jurídico, tenderão a restringir a circulação de conteúdos com potencial de violação. Na prática, isso pode ser ainda mais severo do que uma punição formal.


Plataformas como agentes reguladores privados


Embora o ECA Digital conceda às plataformas obrigações amplas, como remoção imediata de conteúdo prejudicial e mecanismos de detecção de risco, isso suscita debate sobre a transferência excessiva de responsabilidades estatais para atores privados. Essa crítica, presente na literatura internacional, também se aplica ao Brasil. Entretanto, para o marketing de influência, o fato essencial é que as plataformas se tornam reguladoras de fato: detêm o poder de derrubar conteúdos, punir contas, restringir publicidade e exigir comprovações documentais antes da liberação de campanhas.

Essas exigências tendem a se intensificar, especialmente para perfis que apresentam grande concentração de público infantil. Relatórios semestrais de transparência, canais específicos de denúncia, controles parentais, sistema de verificação etária e políticas mais agressivas de moderação tornam-se elementos permanentes de compliance. A ausência desses mecanismos poderá gerar multas que chegam a 10% do faturamento do grupo econômico, além de suspensão de serviços, o que aumenta a tendência de as plataformas adotarem padrões mais rígidos do que o mínimo exigido.


A advocacia preventiva e litigiosa no ecossistema da influência diante do ECA Digital


À medida que o ECA Digital inaugura um novo regime jurídico de responsabilidade no mercado de influência, torna-se evidente que o setor passa a exigir não apenas adaptação técnica dos criadores e das marcas, mas também uma atuação jurídica altamente especializada. A natureza dinâmica da produção de conteúdo, a velocidade das campanhas e a permeabilidade entre marketing e relações de consumo formam um ambiente em que decisões tomadas em segundos podem gerar efeitos jurídicos imediatos — desde notificações administrativas até exclusão de contas inteiras. O papel do advogado, nesse cenário, deixa de ser reativo para assumir uma função estrutural.

A advocacia preventiva assume protagonismo quando percebe que a mitigação de riscos se inicia antes da gravação do vídeo ou da publicação do story. A elaboração de contratos específicos para a creator economy, diferentes dos modelos tradicionais de publicidade, torna-se indispensável. Eles precisam prever responsabilidade editorial, regras de impulsionamento, diretrizes de exposição de crianças, cláusulas de compliance algorítmico e, sobretudo, mecanismos que demonstrem diligência do influenciador e da marca frente às novas exigências legais. O chamado content clearance — a revisão jurídica prévia de roteiros, campanhas, challenges e peças de divulgação — emerge como ferramenta essencial. Ele evita que marcas e creators publiquem conteúdos que, embora aparentemente inofensivos, possam ser enquadrados como publicidade velada, tratamento irregular de dados de menores ou práticas comerciais abusivas.

Mas o ambiente jurídico do marketing de influência não se esgota na prevenção. As plataformas, ao assumirem deveres mais estritos de moderação, intensificam a possibilidade de derrubadas sumárias baseada em denúncias, automatismos ou interpretações rigorosas do ECA Digital. Nesse intervalo, a advocacia contenciosa passa a atuar tanto na recuperação de contas suspensas — que frequentemente representam o principal ativo econômico do influenciador — quanto na obtenção de restauração de conteúdos indevidamente removidos, notificações contratuais entre marcas e creators, pedidos de indenização decorrentes de quedas abruptas de engajamento ou da interrupção forçada de campanhas. Em alguns casos, torna-se necessário recorrer a medidas judiciais urgentes para impedir que uma suspensão cause danos irreversíveis à carreira do influenciador ou às entregas contratadas por marcas.

Também há espaço para litígios dirigidos às próprias plataformas, buscando responsabilização por falhas na moderação, violações do devido processo digital ou implementação equivocada dos fluxos de notice and takedown. O advogado especializado, nesse cenário, não atua apenas como defensor de interesses individuais, mas como intérprete da nova gramática regulatória, conectando as exigências do ECA Digital às disposições do Marco Civil da Internet, da LGPD e das normas consumeristas. Esse olhar integrado é o que permite oferecer segurança jurídica real a quem vive da exposição digital e constrói marcas na interseção entre entretenimento, economia e tecnologia.


Conclusão: o fim da era da monetização a qualquer custo


O ECA Digital impõe ao marketing de influência um novo pacto ético. Se a última década foi marcada pela captura irrestrita da atenção infantil, pela exploração de vulnerabilidades cognitivas e pela publicidade disfarçada, a partir da vigência da nova lei abre-se espaço para um ecossistema mais responsável. As marcas que compreenderem rapidamente esse movimento tendem a ganhar vantagem competitiva, pois alinharão sua comunicação à proteção dos direitos da criança — uma pauta que transcende o jurídico e se converte em ativo reputacional.

Influenciadores, por outro lado, precisarão repensar estratégias, assumindo maior transparência e limites mais definidos no contato com audiências jovens. A lógica do “conteúdo acima de tudo” perde espaço para um modelo em que responsabilidade e conformidade com o ECA Digital se tornam pré-condições para a própria existência da atividade.

No fim, trata-se menos de restringir a criatividade dos criadores e mais de reconhecer que o ambiente digital — amplificado por algoritmos, inteligência artificial e modelos agressivos de atenção — pode produzir danos que a sociedade não pode mais tolerar. O ECA Digital, apesar de imperfeito e desafiador, expõe com clareza que a proteção da infância não é uma escolha regulatória: é um imperativo civilizatório.






Bruno Calixto | Seu aliado jurídico no mundo digital.

Conectando Direito, Negócios, Inovação e Creator Economy.

Assessoria jurídica para quem empreende, cria e influencia.


  • Whatsapp
  • Linkedin
  • Instagram
Bruno Calixto Advocacia - Todos os direitos reservados ©
bottom of page